O REI DE AMARELO – ROBERT W. CHAMBERS

“Camilla: O senhor deveria tirar a máscara.

Estranho: É mesmo?

Cassilda: É mesmo, está na hora. Todos tiramos nossos disfarces, menos o senhor.

Estranho: Eu não estou de máscara.

Camilla: (Horrorizada, em particular para Cassilda.) Não é máscara? Não é máscara!”

O rei de amarelo, Ato 1, Cena 2


•SINOPSE•

Obra-prima de Robert W. Chambers, O Rei de Amarelo é uma coletânea de contos de terror fantástico publicada originalmente em 1895 e considerada um marco do gênero. Influenciou diversas gerações de escritores, de H. P. Lovecraft a Neil Gaiman, Stephen King e, mais recentemente, o escritor, produtor e roteirista Nic Pizzolatto, criador da série investigativa True Detective, cujo mistério central faz referência ao obscuro Rei de Amarelo.

A peça “O Rei de Amarelo” é mencionada em quatro dos contos, mas pouco se conhece de seu conteúdo. É certo apenas que o texto, em dois atos, leva o leitor à loucura, condenando sua alma à perdição. Um risco que alguns aceitam se submeter, dado o caráter único da obra, um misto irresistível de beleza e decadência.

A edição de O Rei de Amarelo pela Intrínseca reúne, além dos contos do Rei, seis outros que alternam entre o sobrenatural e a realidade, em épocas e geografias diferentes. A introdução e as notas do jornalista e escritor Carlos Orsi, um dos autores publicados na antologia americana Rehearsals of Oblivion, clássico tributo a Chambers, ajudarão novos leitores a mergulhar na bem construída mitologia do autor.


Robert W. Chambers, é pouco conhecido no Brasil, foi pintor e ilustrador antes de se tornar escritor, viveu algum tempo na França onde estudou arte na Escola de Belas Artes e na Academia Julian, em Paris, foi fortemente influenciado por Oscar Wilde e seu decadentismo francês.

O título do livro faz alusão a um livro dentro do livro, uma peça teatral fictícia e macabra, não encenada, chamada “O Rei de Amarelo”, não se sabe quem o escreveu, mas se trata de uma peça dividida em dois atos. Dizem que o texto de seu segundo ato é tão belo, que é considerado amaldiçoado tendo em vista a loucura, e insanidade arrebatadora e doentia que causava em todos aqueles que o liam. Seu personagem central é uma figura sobrenatural, um Rei de vestes amarelas.

“O Rei de Amarelo” escrito por Chambers foi publicado originalmente em 1895 e é tido hoje como um marco do gênero.

“Então, mergulhei nas profundezas e ouvi o Rei de Amarelo sussurrando para minha alma: “Horrenda coisa é cair nas mãos do Deus vivo”!” 

É uma coletânea de dez contos, sendo que os 4 primeiros estão diretamente relacionados à obra fictícia, esses contos estão de certa forma interligados, quer seja por nomes ou locais, se passam no mesmo universo da tal peça sinistra que de alguma forma os personagens acabam entrando em contato sofrendo de suas influências malignas. Há 2 contos intermediários considerados de transição entre o sobrenatural e o real, o delirante e o alegórico, além de trágico, onde eu destaco “A Demoiselle d´Ys”, um dos melhores contos do livro. Os 4 últimos contos, chamados de “Quarteto das Ruas”, são contos realistas de tom mais romântico (sem a influência do sobrenatural), seus protagonistas são muitas vezes pintores ambientados na Paris da Belle Époque, em que são descritos os costumes e o cotidiano boêmio dos estudantes de arte norte-americanos no famoso Quartier Latin.

Como dito na introdução, realmente não fica muito claro onde e quando as histórias são ambientadas. Há quem ainda acredite na teoria de tempo e espaço que parecem se misturar em um conceito de que o universo de “O Rei de Amarelo” seria mesmo um pesadelo coletivo, um limbo onde se encontram todos os males profanos compartilhados em sonhos por todos nós humanos.

“Ele chegou à porta, e os cadeados apodreceram a seu toque. Ele havia entrado”.

Chambers possui uma escrita inteligente, uma narrativa deliciosa e bem romanceada, além de grande habilidade ao transformar descrições de coisas comuns, em coisas assustadoras. Ele criou uma mitologia própria que hoje é chamada de “mitologia amarela”, em torno de “O Rei de Amarelo” e “Carcosa”, uma cidade sombria e misteriosa. Mitologia essa que apesar de pequena, é bem rica, e nesse ponto sou obrigado a concordar com Carlos Orsi quando ele diz que “Chambers tenha sido, de certa forma, um escritor superior à própria obra, e que com algum esforço poderia ter criado um legado literário muito superior ao que realmente produziu”. Talvez por isso essa impressão que eu tenho de que falte algo, de incompletude… Entre alguns outros motivos, o livro para mim não funciona tão bem, e aqui vou considerar somente uma coisinha que é o pior dos males de um leitor: Expectativas em demasia.

Eu sinceramente esperava algo mais, não que o livro seja ruim, pelo contrário, suas histórias são muito boas e eu gostei bastante, mas esperava aquele arrepio frio que sobe pela espinha, aquele horror impresso na pele, na improbabilidade, no inimaginável que permeiam os temores universais.

Claro, há sim, uma atmosfera de terror bem construída, mas não tão perturbadora, há o suspense de não se saber de que forma o livro influenciara os personagens que às vezes se parecem confundir entre sonho, realidade e fantasia.

“Sempre me recusei a ouvir qualquer descrição sobre o livro, e, na verdade, ninguém jamais se aventurou a discutir a segunda parte em voz alta, então eu não tinha absolutamente nenhum conhecimento do que aquelas páginas poderiam revelar. Olhei para a encadernação malhada e peçonhenta como olharia para uma cobra.”

A edição da Intrínseca tem a capa com uma textura parecida com pele de cobra (assim como é descrito o livro ficcional), que ainda possui uma diagramação bem bonita com divisões de cada conto com páginas negras iniciadas com um poema. A introdução do livro é do escritor e jornalista Carlos Orsi, assim como as notas explicando as possíveis ligações e teorias sobre os contos, além de citar alguns fatos históricos presentes na obra.

A única coisa que incomoda bastante são as anotações que ficam ao final de cada conto, ao invés de no rodapé ou mesmo no final do livro, é um tanto desconfortável ter de busca-las, pois é preciso que você tenha que parar a leitura e procurar as notas ao ficar indo e vindo entre as páginas.

Com relação à cor, é dito que no final do século 19, o amarelo simbolizava o pecado, a podridão, a decadência e a loucura, não sendo por acaso a cor que eram encadernados os livros dos decadentistas franceses, cujo a literatura era considerada um literatura leprosa de putrefação moral e espiritual.


Livro: O Rei de Amarelo

Autor: Robert W. Chambers

Editora: Intrínseca

Páginas: 256

Nota: 3/5